De pequena notável à brazilian
bombshell.
Portuguesa de nascimento,
Carmen Miranda foi criada na Lapa carioca, que nas décadas de 1910 e 1920 era
um caldeirão cultural de artistas, malandros e gente de todo tipo. Assimilando
a estética, a linguagem e as novas sonoridades do lugar e da época, aprendeu as
gírias e expressões das rodas boêmias, suas favoritas, e criou um personagem
que seria uma representação do século 20.
Carmen foi a primeira artista
multimídia do Brasil. Talentosa, não só cantava, dançava e atuava, mas sabia,
intuitivamente, transitar com desenvoltura pelo que viria a se tornar a
indústria cultural.
Transformou-se num ícone das
massas, ao mesmo tempo criando e sendo criada por esse novo mundo do
entretenimento que se desenhava. Pioneira, foi a maior estrela do disco, do
rádio, do cinema, dos teatros, da mídia, e dos cassinos brasileiros.
Dançando com o Pato Donald
Cena do filme “Você já foi à Bahia?
”
Única no movimento das mãos e
quadris e no revirar dos olhos verdes, estilizou a baiana, com badulaques, a
boca pintada de vermelho, sempre sorridente e tão imitada, amada e parodiada em
todos os cantos do mundo. Mais tarde, viraria boneca de papel e desenho animado
da Disney.
Ela eternizou os mais
importantes compositores de seu tempo da música brasileira, de Lamartine Babo a
Ary Barroso, de Dorival Caymmi a Pixinguinha. Gostava de tango, mas investiu na
gravação de marchinhas de carnaval e sambas, que tratava de cantar à sua maneira,
muitas vezes trocando a letra das músicas, acrescentando uma bossa própria, um
jeito de sublinhar as palavras com seus muitos erres vibrantes.
Pessoalmente, vivia rodeada
pela família e era muito querida pelos amigos. Não teve filhos, mas, à frente
do seu tempo, foi uma mulher de grandes amores, namorou o atleta Mário Cunha, o
industrial Carlos Alberto da Rocha Faria, o músico Aloysio de Oliveira e David
Sebastian, o único com quem se casou.
Protagonista de uma carreira
meteórica, Carmen conseguiu uma projeção internacional como nenhuma outra
artista do país, primeiro na Argentina e outros países da América Latina e
depois nos Estados Unidos, Europa e em todo o mundo. É até hoje a única
latino-americana a gravar pés e mãos no cimento da calçada da fama de Los
Angeles.
Nos Estados Unidos, cantou em
português para um público que não entendia uma palavra do que ela dizia, mas
como todo mito, foi alvo de polêmicas e controvérsias.
No cinema americano, teve a
imagem atrelada à caricatura da mulher latina, ciumenta, irritada, de sotaque
carregado e exagerado, o que era incentivado pelos produtores americanos, ainda
que Carmen, na vida real, falasse inglês muito bem.
Do lado brasileiro, foi
acusada de ser instrumento da estratégia americana de boa vizinhança com os
países latino-americanos antes da Segunda Guerra e também de servir ao
populismo de Getúlio Vargas. Acusavam-na ainda de acentuar os estereótipos do
Brasil, de rebuscar os gestos, de “americanizar-se”.
Massacrada por inúmeros
compromissos de trabalho, por pílulas para dormir e para acordar, pela
engrenagem de Hollywood, morreu na madrugada de 5 de agosto de 1955, após a
gravação de um programa de televisão em Los Angeles, com apenas 46 anos.